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CIDADES: PALCO DAS LUTAS DE CLASSES NO MEIO URBANO

Tita Carneiro


Desde a década de 1950, com acento para os anos de 1970, sabemos mediante os dados oficiais, ilustrações de filmes e teóricos orgânicos das frações burguesas e populares que houve o significativo êxodo do campo para a cidade. Assim presenciamos o inchaço das cidades no que se refere à densidade populacional, visibilidade do trabalho informal e toda sorte de mazelas conhecidas pelas periferias urbanas no que toca à inconclusão das reformas estruturais realizadas pela burguesia no caso brasileiro. Muitas vezes o que chamamos de pautas das frentes urbanas e, que de alguma forma coincidem com a ausência de reforma agrária e urbana, as mazelas decorrentes tais como saneamento básico, educação, saúde têm se constituído enquanto motor de nossa atuação nas cidades que circundam as capitais brasileiras de norte a sul deste país.

Recife-PE. Foto: Andrea Rego Barros. Reprodução Brasil de Fato PE.

Os últimos anos marcam a simultânea fascistização da sociedade, aumento do conservadorismo, robusteza do racismo e patriarcado e agravamento de medidas neoliberais junto ao cenário de pós-guerra deixado pela pandemia do covid-19. Assim, o agravamento das condições de vida das camadas populares e o achatamento, inclusive da vida de setores médios evidenciam a emergente necessidade de politização destes fenômenos junto aos sujeitos protagonistas destas lutas de classes nas periferias urbanas. Politização esta, necessária de ocorrer no tempo histórico em que os sujeitos vivem. Vou dar um exemplo, a tentativa de politizar a falta de moradia enquanto os sujeitos estão às vésperas de serem despejados ou o esforço em tentar politizar a instrumentalização da fome junto aqueles que hoje vivem em situação de insegurança alimentar. Este desafio é imenso, ele percorre a formação desigual, regional, percorre o campo, as cidades, os rios, percorre também o tempo histórico.

Desafio candente da esquerda brasileira, de forma mais demarcada, pelo menos desde os anos 70, ganhou contorno no debate histórico acerca dos chamados novos personagens (movimentos ligados à emergência deste cenário urbano e aos seus sujeitos protagonistas, movimentos negro, de mulheres e pela diversidade) quando comparados aos formatos clássicos de organização (operários de setores estratégicos, sindicalizados, trabalhadores formalizados) e se coloca ainda hoje como uma problemática a ser adensada, compreendida e formulada por nós, militância orgânica que luta por justiça social. O encontro de todos estes sujeitos próprios de seu espaço-tempo quando enraizados no meio do povo e com horizonte estratégico de tomada de poder revelam que antes do que antagônicos, complementam-se e aceleram a possibilidade de concretização de uma revolução brasileira amparada em amplos e diversos setores.

Este que é um debate histórico na história da organização latino-americana e brasileira continua sendo extremamente necessária de ser enfrentada, por diversas razões, sendo que uma delas é que o movimento histórico da composição da classe trabalhadora não é estático e nem se encerra. A atualidade revela que hoje as massas de trabalhadoras informais (desempregadas ou não) recolocam a questão da centralidade das lutas urbanas. Cito como exemplo, o trabalhador que está desempregado e por isso não consegue mais pagar aluguel e está morando na rua com sua família, teria mais condições nestas circunstâncias, em se organizar junto às pautas por moradia ou direitos trabalhistas? E os demais membros de suas famílias e comunidades? Esta pergunta deve abrir debates e não fechar as suas portas.

A necessidade da politização das urgências referentes às pautas econômicas diante o cenário conjugado entre enraizamento do neofascismo no interior da classe trabalhadora e o nível de miserabilidade que hoje vivem famílias organizadas por nós no trabalho urbano e, portanto a dificuldade em ampliação do horizonte de luta no sentido individual quanto coletivo nos colocam o imenso e profundo desafio de sermos parte da reconstrução da vanguarda compartilhada que compreende o programa democrático-popular como parte necessária à realização da estratégia revolucionária de tomada de poder. Esta é uma das tarefas candentes de uma organização viva e pulsante como a nossa na atual conjuntura de esmagamento cotidiano das camadas populares, marginalizadas à própria sorte pelas elites que consonantes com representantes do imperialismo e neofascismo dirigem o continental Brasil.


Tita Carneiro é doutora em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (UFBA) e militante da Consulta Popular de Pernambuco.



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