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A LEI ORGÂNICA MUNICIPAL E O TRANSPORTE COLETIVO EM ILHÉUS: ALGUMAS QUESTÕES A SEREM TRATADAS

Atualizado: 15 de fev. de 2022

Igor Campos


A cidade de Ilhéus atualmente enfrenta sérios problemas com relação ao transporte público urbano e rural. Não bastam os contratempos da superlotação dos ônibus e da irregularidade nos horários da frota, como sua indisponibilidade a partir das 21h e nos finais de semana, ainda ocorre diariamente descasos com a manutenção dos veículos por parte das empresas, ocasionando falhas frequentes na efetivação do serviço. Os incômodos mais constantes que temos presenciado nas redes sociais estão na ordem de falhas mecânicas, como mau funcionamento do motor, forçando sua parada; péssima ventilação; ar-condicionado e elevadores continuamente quebrados; sem contar a inoperância do wi-fi, prometido pelas duas viações, que teve seu funcionamento descontinuado sem nenhuma justificativa aparente.

O descaso também ocorre por parte do poder público municipal, que não fiscaliza as empresas e permite que elas atuem da forma que desejam. Conforme o art. nº 269 da Lei Orgânica do Município de Ilhéus (nº 01/1990), é “responsabilidade do Poder Executivo Municipal o planejamento, fiscalização e a operação ou concessão das linhas” do transporte coletivo de passageiros. (ILHÉUS, 1990) O mesmo artigo, em seus incisos II, III, IV, VI, VIII e IX, ainda garante que é a prefeitura quem define “o tipo de veículo a ser utilizado”; “a frequência do serviço e o horário de atendimento”; os “padrões de segurança e a manutenção”; o “itinerário da linha e seus pontos de parada”; as “normas relativas ao conforto e a saúde dos passageiros e operadores do veículo”; e o “valor máximo da tarifa, mediante anuência do Poder Legislativo”. (IDEM)

É interessante nos determos um pouco mais neste artigo, visto que nele estão alguns parágrafos-chaves para entendermos a gravidade da situação na nossa cidade. Já no primeiro deles é ressaltado que “O município adotará as medidas necessárias, para coibir o monopólio da exploração dos serviços de transporte coletivo.” Em seu parágrafo quarto é definido que “Será obrigatória a manutenção de linhas noturnas em toda a área urbana do município.” e no quinto estabelece-se que “Ao Poder Executivo é dado o direito de intervir nas concessionárias de serviço de transporte coletivo que praticarem atos lesivos aos interesses da comunidade e à política do transporte público, assim definido em lei.”. (IDEM)

Ônibus da empresa Via Metro perde um dos lados da porta traseira na Av. Canavieiras. Foto: Reprodução Blog A Região.

Pela experiência prática cotidiana percebemos que estas competências também não estão sendo cumpridas pela prefeitura. Primeiro porque, em nosso município, as duas empresas que fornecem o serviço de transporte coletivo controlam todo o sistema de transporte da cidade, impedindo (com o auxílio do Poder Executivo) quaisquer outras formas de mobilidade urbana – vide as perseguições às “lotações”, transporte irregular que cada vez mais vai se tornando opção entre a classe trabalhadora.

No segundo caso, em relação à manutenção das linhas noturnas, temos presenciado o descaso das empresas e da prefeitura, pois a maior parte da frota para de rodar a partir das 21h, deixando localidades como o Salobrinho - que ainda é zona urbana - isoladas. Sobre isso, o Executivo municipal nada faz e o diretor da Superintendência de Trânsito, Transporte e Mobilidade de Ilhéus (Sutram), Valci Serpa, em entrevista ao Blog PIMENTA afirmou que “as concessionárias do transporte coletivo, Viametro e São Miguel, cumprem sua parte no acordo feito com a Prefeitura e homologado pela 1ª Vara da Fazenda Pública de Ilhéus.”. (BLOG PIMENTA, 2022)

No último caso, diante de tantas situações lesivas “aos interesses da comunidade e à política do transporte público” por parte dessas empresas, não presenciamos nenhuma intervenção do Executivo municipal nessas concessionárias. Ao mesmo tempo, não há o cumprimento do art. nº 272, que diz respeito à competência do Município de Ilhéus em relação à “fiscalização dos serviços de transporte coletivo na órbita da sua jurisdição”. (ILHÉUS, 1990) Como exemplo prático, presenciamos diariamente a inobservância do parágrafo terceiro do mesmo artigo que informa sobre a obrigatoriedade da “presença do cobrador em todas as linhas urbanas e rurais, exceto nos veículos de até 32(trinta e dois) passageiros sentados, desde que não ultrapasse o limite máximo de 25% (vinte e cinco por cento) da frota total. (Emenda n° 001/2011).” (IDEM) Atualmente toda a frota de Ilhéus está sem cobradores.

Finalmente, no parágrafo sexto do art. nº 275 é estipulado em cinco anos “a idade máxima do veículo em circulação” contados a partir da data de sua fabricação. Além disso, no parágrafo oitavo é estabelecida a obrigatoriedade do emplacamento no município “dos veículos de propriedade ou a serviço dos concessionários no prazo de 90(noventa) dias a partir da entrada em operação.” (IDEM) Todavia, na cidade circulam veículos de transporte coletivo com emplacamentos do Estado de Minas Gerais e que ultrapassam a idade de circulação permitida. Esses são mais dois casos em que a experiência prática cotidiana mostra a ineficácia de alguns dispositivos legais, pela simples falta de interesse do Poder Executivo municipal.

Toda essa situação gera um sentimento de abandono e, desse modo, os usuários do serviço (me incluindo) compartilham diariamente a sensação de revolta contra as empresas que atuam nesse setor, bem como contra a prefeitura municipal, que as regulamenta.

Em vista de tudo isso, cabe a nós iniciarmos o debate sobre a situação do transporte coletivo urbano e rural na cidade de Ilhéus, cobrando soluções aos entes competentes e propondo meios para mudarmos e superarmos o caos e os desmandos das empresas que atuam na cidade.



Referências


ILHÉUS, Lei Orgânica do Município de Ilhéus (1990), Capítulo XVIII – DO TRANSPORTE COLETIVO URBANO E RURAL. Disponível em: https://www.ilheus.ba.gov.br/legislacao. Acesso em: 12 de fev. de 2022.





Igor Campos é mestre em História pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB), militante do Partido dos Trabalhadores, faz parte da JPT Ilhéus e é integrante do Coletivo Brasil Vermelho.

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