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MILITO NO MOVIMENTO NEGRO PORQUE LÁGRIMAS NEGRAS CAEM, SAEM E DOEM

Caio Pinheiro


No dia 26 de janeiro do corrente ano, o cantor Baco Exu do Blues lançou seu terceiro álbum de estúdio intitulado “Quantas vezes você já foi amado”. Não sendo crítico musical, me atreverei a dizer que é um álbum conceitual; repleto de questões existenciais e necessárias, principalmente para o povo preto.

Amor afrocentrado, autoestima e racismo são questões que perpassam todas as faixas do álbum. A nona faixa, nominada de “lágrimas”, se destaca pelo refrão “lágrimas negras caem, saem e doem”. Bacu foi corajoso e propositivo ao utilizar sua poética para se contrapor à desumanização do negro pelo racismo. Desumanizados, negros e negras são desautorizados a sentirem dor e chorarem. Daí, reverencio Baco por nos lembrar que “lágrimas negras caem, saem e doem”.

Contudo, importa destacar que a coragem poética de Bacu representa negros e negras orgulhosos (as) de sua negritude que lhes antecedeu. Falo de homens e mulheres que resistiram à política de bestialização, apagamento e silenciamento da África presente em seus corpos e imaginários. A estes e estas, vivos ou tornados um passado-presente, também devoto reverências na condição de homem afrocentrado.

Caio Pinheiro. Foto: Arquivo pessoal.

Faço parte de uma geração de negros que foi levada a acreditar que vivemos num paraíso racial. Um país dominado por relações raciais harmoniosas. Até entender as implicações de ser negro no Brasil, acreditava piamente que nessas terras o racismo era uma mera "fantasia”. Com esse entendimento, concluía que se existiam poucos negros em espaços de poder, era consequência da falta de empenho ou mérito dos mesmos, mas nunca do racismo. No entanto, ao me aninhar no Movimento Negro, foi possível compreender que num país de passado escravocrata, seria muito pouco provável florescer um paraíso de relações inter-raciais harmônicas. Daí, mesmo que haja opiniões em contrário, provavelmente falaciosas, o Brasil é um território no qual a ascendência africana de negros e negras é tomada como obstáculo ao seu sucesso socioeconômico.

Isso explica o motivo do racismo ser estrutural. Amenizando a linguagem acadêmica, isso significa que todas nossas relações, em maior ou menor grau sofrem a interferência do racismo. Um racismo que ardilosamente se camuflou sob o manto do mito da democracia racial, além de negar sua responsabilidade na marginalização e assassinato de corpos negros. Então, contra esse estado coisas ainda tão desfavorável ao povo negro – à despeito dos avanços da última década -, a união de negros e negras continua a ser alternativa mais viável para resistir. Dito isso, preciso compartilhar a alegria de assumir a vice-presidência da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO) seção Ilhéus. Decisão baseada no desejo de que chegará o dia no qual lágrimas negras caiarão e sairão pela superação do racismo que continua doendo. Laroyê Exu!



Caio Pinheiro é historiador, educador, escritor e militante do Movimento Negro.

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